Joabe Reis
Romance
UM
Aquele dia começara como outro dia qualquer na centenária
universidade onde eu estudava num país da América do Sul, havia pessoas
sentadas na grama, outras transitando e fazendo muita doideira, com papos do
tipo, drogas, baladas, sexo e futebol, mas somente um fenômeno inusitado
despertava a minha atenção quase sempre insensível e bastante cobrada
principalmente pelas donzelas impuras por muitas vezes alvos do meu ritual de
sedução, de modo inefável o brilho incandescente do sol que iluminava intensamente
o campus, curiosamente de forma incomum para àquelas horas do dia, penetrava
entre as folhas da palmeira que me emprestava sua sombra enquanto eu aguardava
a chegada dos meus amigos e me atraia como um ímã. A Universidade Federal
ficava afastada do centro urbano, era cercada por um bosque disforme cheio de
muitas árvores floridas, como o Ipê roxo e o Ipê amarelo, e muitas pequenas
pedras pretas espalhadas sistematicamente em fileiras como se alguém tivesse
passado meses desenvolvendo um trabalho artístico. Diziam os mais antigos que
ali fora, durante muitos séculos há milhares de anos antes, a morada de tribos
guerreiras e onde muitos deles foram abatidos durante ferrenhas batalhas com
criaturas malignas, conversa na qual jamais depositei minha crença. E sem saber
por que eu olhava para um lado daquele bosque a minha direita, onde havia uma
trilha sombria pela qual certamente centenas de vezes aquelas tribos guerreiras
passaram indo ou retornando de suas batalhas, por ali nenhum dos universitários
gostava de caminhar quando tinham permissão de passear no bosque, mas
inexplicavelmente eu sentia uma força me aliciando de forma sobrenatural como
eu jamais tinha presenciado na minha vida de garoto do interior, aquela força
irresistível tentava me levar ao seu encontro em algum lugar dentro da
floresta. Os meus amigos logo chegaram e vieram até mim cheios de bom humor,
como todo dia, mas logo perceberam o meu estado absorto, pois estranhamente não
me juntei a eles nas divertidas gargalhadas, como fazia em todas as outras
vezes que eu chegava à universidade. Aqueles eram os meus melhores amigos e não
havia nada que eu fizesse sem compartilhar com eles. Mas naquele momento a
razão havia fugido de mim como se a minha alma do alto estivesse olhando para o
meu corpo, eu os via caminhando em minha direção e apontarem na minha direção
mexendo os lábios, mas suas vozes pareciam estar em tão baixo volume que eu não
conseguia ouvir, a força sobrenatural já me carregava afastando cada vez mais a
minha alma do meu corpo e o silêncio absoluto me separava daquela realidade
enquanto eu podia ver por trás de uma imensa cortina transparente um castelo
com duas altas torres imponente no meio de uma floresta de fim inalcançado
pelos meus olhos, foi quando então o meu corpo começou a ser sacudido e eu
passei a ouvir bem baixinho uma voz, alguém gritava o meu nome:
- Marcus!
Marcus? – um deles tentava me despertar daquele transe sinistro. Meus amigos
deviam estar preocupados com o meu estado.
De repente eu
pude sentir que a minha alma retornava se aproximando de modo apressado e o meu
corpo ficava mais perto até que em fim consegui dizer algo: - Sim. – respondi
fitando pelo canto dos olhos a minha amiga Amanda já perto de mim a frente dos
demais. Ela era como uma flor intocada revestida de uma beleza singular, uma
raridade que sempre deixava meus olhos hipnotizados e o coração sem domínio,
mas não sei por que pela primeira vez eu estava imune ao encanto daquela
beleza.
Ela sorridente
continuou a falar comigo - Poxa Marcus, você hoje está tão distante! O que está
acontecendo contigo? – disse depois de se abaixar bem perto de mim e por a mão
no meu ombro direito.
- Na verdade
eu não sei. – respondi sem emoção. O sangue devia ter fugido do meu rosto pelo
modo como ela me alisava a face com um olhar de espanto.
- Que tal
darmos uma volta no bosque? – sugeriu Lígia, a amiga mais extravagante do
grupo. Lábios pintados de um vermelho forte e uma saia bem curta, tipo
periguete.
Aquela
sugestão me agradava, podia ser uma coincidência, mas a força sobrenatural
voltava a exercer um certo poder sobre mim.
- Vamos!
Estamos sem nada para fazer mesmo. Levamos os nossos livros e ficamos um tempo
por lá. – disse Rael entusiasmado, estudar nunca fora seu forte.
Eles esbanjavam
energia e não paravam de falar.
Cômica Lígia
comentou: - Assim quem sabe o Marcus volta para o nosso mundo, porque ele está
viajando em outra galáxia, ta entendendo? – ela me olhou de um jeito terno, eu
sabia que ela, assim como os outros, só queria me ver bem.
Enquanto
caminhávamos para o bosque a misteriosa força ficava mais forte a cada passo
que eu dava, eu estava totalmente dominado. A turma sorria em conseqüência das
brincadeiras jocosas, mas em mim havia uma ansiedade crescente e uma apreensão
apertando o peito, havia algo esperando por mim lá, eu podia sentir.
Seguíamos
caminhando numa trilha coberta por folhas secas dispensadas das altas árvores,
com a intenção de explorar a pequena floresta como experientes pesquisadores a
fim de ocuparmos o tempo tedioso da espera pelo começo da aula. E somando ao
inusitado momento que eu vivia, a aula de dramaturgia do dia anterior mexera
comigo. A Lenda do Amor Perdido me comovera sensivelmente com uma história de
amor impossível vivida por um judeu e uma romana nos tempos da invasão de
Jerusalém pelo império romano.
Após passarmos
entre dois pequenos arbustos que cercavam a trilha, nos deparamos com um achado
surreal causando espanto em cada um dos exploradores.
- O que é
isso? – Amanda foi a primeira a ver, pois puxava a fila.
A força que me
seduzia estava bem perto e parecia querer me sugar pelas entranhas do tempo e
espaço.
Um cenário
estranho começou a surgir em nosso derredor e não era apenas eu que podia ver -
Meu Deus é lindo! – Rael estava pasmo ao se defrontar com a coisa a sua
esquerda.
Lígia tomou a
minha frente e disse com um tom de admiração – Minha nossa! É maravilhoso.
Podemos ficar aqui? – perguntou elevando os braços com as palmas das mãos pra
cima fazendo a sua blusa vermelhar subir um pouco deixando descoberta uma
tatuagem no final das costas
Eu estava
perplexo por contemplar tão bela relíquia de certamente centenas de anos e, no
entanto, num estado de conservação impressionante. De repente percebi que a
força aliciadora havia me abandonado e eu já tinha o controle das minhas ações.
Senti vontade de tocar naquelas pedras esculpidas de forma surpreendentemente
perfeita lembrando-me de certas cenas que vi no cinema. Certamente aquelas
pedras tinham um valor incalculável, pensei. – Vamos ficar aqui sim. – falei
depois de um tempo em silêncio – Sinto que há muito para descobrirmos.
Pusemo-nos a
perscrutar o local e logo alguém gritou de modo histérico – Venham ver o que eu
achei! – era Rael que havia encontrado alguma coisa e de longe eu pude vê-lo
retirando de modo apressado as folhas que cobriam uma caixa velha marrom
parecendo ser de madeira.
- O que será
isso? – perguntou Lígia curiosa como sempre, fazendo de seus dedos os seus
olhos.
A curiosidade
era de todos.
- É um cofre,
pessoal! – Rael berrou mais adiante.
Em instantes
rodeamos a descoberta muito real e não podia ser um objeto de brincadeira
plantado no bosque para servir de pegadinha.
Eu discordava
de Rael, não era possível ser um cofre, ou alguém já teria encontrado, sendo um
objeto daquele tamanho. Eu não conseguia entender como aquilo podia estar ali.
- É, parece
ser bem antigo. Vamos abri-lo? – Rael segurou no cadeado – pode ser um tesouro
deixado aqui por piratas – comentou com certo humor.
Porém, para
nos apavorar, quando mexíamos no cadeado uma voz grave ecoou misteriosamente
pelos quatro cantos do bosque, a voz dizia a palavra Não de usando um tom
hostil. Olhamos em volta assustados, mas nada pudemos ver. Rael, no entanto
estava curvado sobre o baú e ignorou a voz acreditando que fosse mais uma
brincadeira minha. – Por que não? Vamos ver o que tem dentro, cara! Quem sabe
não é um tesouro real. – ele estava decidido a quebrar o cadeado segurando uma
pedra prestes a fazer a primeira batida.
- Não é! – a
voz nítida de tom grave manifestou-se outra vez deixando a mim e as garotas,
arrepiados.
- Como você
sabe, Marcus? - Rael continuava
ignorando a voz olhando apenas para o baú.
Gaguejando
respondi que não era a minha voz, então ambos nos viramos e a surpresa foi
espantosa. Um homem de longa barba e cabelos brancos olhava para nós apoiado
num cajado dourado. Parecia que todos nós havíamos consumido um baseado e
estávamos compartilhando a mesma alucinação.
- Hei! De onde saiu isso? – Foi a pergunta
de Rael apontando para o velho.
Arranquei
coragem de onde não tinha e com a voz falhando perguntei quem era ele e como
aparecera daquela forma. As minhas pernas tremiam. – Você é real? – ainda
indaguei.
O velho aproximou-se de nós, abriu bem os
olhos e então começou a falar compassadamente: - Meu Nome é Ghelf Rharum. Sim,
sou real como também sou o guardião desse santuário oculto, agora violado por
vós após milhares de anos, imaculado. Não podeis abrir essa caixa! Isto eu não
permitirei. – eu permanecia imóvel, mal mexia os olhos. – Se esta caixa for
aberta algo terrível irá ocorrer, um fenômeno que jamais suas mentes limitadas
ousariam imaginar. – disse ele num tom macabro.
O pavor tomou
conta de cada um de nós, parecíamos um único corpo, pelo modo como estávamos
grudados. Mas a voz do velho era serena, embora sua aparência causasse muito
medo, seu corpo era tão esguio que parecia esquelético coberto por uma fatiota
que eu nunca tinha visto nada igual antes.
Lígia ergueu o
dedo como se estivesse em sala de aula e perguntou de qual santuário ele
falava.
O velho deu
mais um passo adiante apontou para o baú e disse que ali nós contemplávamos as
provas da mais bela história de amor já vivida por seres do universo inteiro.
Rael parecia
desacreditar do papo cinematográfico do velho misterioso e refutou suas
palavras alegando que um velho gagá daqueles só podia estar com conversa fiada,
não havia a menor possibilidade de que tudo aquilo fosse verdade. – Ele só pode
estar de olho no tesouro. Ô Meu chapa, nós vimos primeiro! – concluiu.
E foi então
que eu vi uma cena antes protagonizada apenas em cinema nos filmes ganhadores
de Oscar. O velho ergueu o cajado no qual se apoiava, apontou para Rael e
disse: - Vós não credes então eu darei uma prova! – tinha o coro da testa
cerrado e um olhar sombrio.
O velho
balançou o cajado e em segundos Rael perdeu os movimentos de todos os músculos
do corpo, ficou como uma estátua de cera.
Aquilo nos
deixou mais apavorados ainda, não sabíamos se saíamos correndo ou ficávamos
para ajudar o amigo, mas o fato é que não conseguíamos sair do lugar, estávamos
com os pés plantados no chão, como se fôssemos plantas do bosque. Pouco tempo
depois o velho tornou a chacoalhar o cajado e Rael voltou a movimentar os
músculos e a falar.
- Agora
credes? – o misterioso velho, e agora aparente feiticeiro, indagou dando mais
um passo em nossa direção. – Eu testemunhei toda esta história – prosseguiu
antes de ouvir a resposta – foi um amor proibido que jamais pode ser consumado
na era passada de um tempo onde a magia e o poder da mente eram instrumentos de
batalhas. Vêem aquelas duas estátuas ali? – apontou para o nosso lado esquerdo
onde havia duas pedras esculpidas com formas perfeitas de seres humanos – Elas
protagonizaram o que antes já afirmei, quando vivas.
Ainda sem
assimilar os acontecimentos repentinos perguntei como elas ainda não haviam
sido descobertas.
O velho olhou
nos meus olhos e revelou que somente uma pessoa de coração puro poderia tornar
visível o santuário quando tocasse com os pés a linha sagrada e um de nós
possuía um coração impoluto.
Uma
interrogação começou a martelar dentro de mim, quem de nós teria um coração
assim? Eu por certo não o teria, não depois do que eu tinha feito duas semanas
antes. Mesmo com a dúvida preferi pedir para que ele contasse a história,
abandonando a curiosidade de saber quem era o dono do coração. Os meus amigos
continuavam calados, pareciam hipnotizados de medo.
O velho pediu
para que sentássemos e sem hesitar comunicou que a história era longa e tomaria
muito do nosso tempo, mas se queríamos ouvir ele contaria. E na verdade ele
parecia um ancião gentil, de um comportamento majestoso, ansioso para conversar
com alguém, ele deveria ter passado muitos anos sem conseguir contato com uma
viva alma.
Acomodamo-nos
sobre as folhas que cobriam o chão e emprestamos os nossos ouvidos ao causo
fabuloso daquele velho cheio de mistério.
Ele caminhou
até as estátuas e deslizou os dedos sobre uma delas pronunciando três palavras
de um idioma desconhecido, em seguida começou a dizer: - Pois bem. Assim tudo
começou. – apoiou as duas mãos sobre o cajado e continuou falando – Foi há
muito, muito tempo, na temida Floresta do Meio numa outra dimensão, uma era
onde os mais fortes eram os que melhor dominavam o poder da magia ou da mente.
Tudo era perfeito. Não havia dor nem sofrimento, a dimensão dos Eufillus, terra
do bem, era um lugar onde o amor reinava insigne, mas seus habitantes por
natureza eram proibidos de compartilharem esse sentimento através do toque
corporal, principalmente os habitantes do condado chamado Pantorian com os
habitantes do condado de Shillon e por isso não o conheciam na prática, mas
espalhavam a outros seres de lugares longínquos, como aos humanos aqui da Terra.
E no início de uma nova era daquela dimensão dois jovens desses dois condados
rivais foram forçados pelo destino a se encontrarem na sala do Senhor do
Império Husfillo no trigésimo dia daquela era de submissão que havia sido
iniciada. Aquele foi o inevitável encontro que mudou o rumo de toda a história,
como Saladim, o profeta, havia previsto.
DOIS
Enquanto o
velho começava a contar a história, senti uma queimação dentro de mim, o mundo
começou a girar e quando por fim percebi, eu podia ver os detalhes de cada
pedacinho das cenas descritas pelo detentor do cajado, assim pude ver um jovem
ajoelhado e com o olhar inclinado aguardando a entrada de alguém numa enorme
sala idêntica aos salões dos castelos imperiais mostrados nos muitos filmes
épicos já vistos por mim. “O jovem aguardava seu novo e desconhecido parceiro
para em fim saber qual seria a próxima missão”, Ghelf Rharum revelou.
A grande porta
do salão foi aberta sendo dividida ao meio gerando uma estreita passagem por
onde entrou com passos tímidos uma jovem de cabelos negros e lisos, vestida em
uma roupa na cor verde claro de detalhes bordados artesanalmente na horizontal
quase colada no corpo deixando visíveis suas formosas curvas. O jovem que
estava de joelhos sentiu uma áurea de doce eflúvio se aproximando, era
diferente de todas as outras vezes quando estivera ali aguardando um novo par.
Com o canto dos olhos conseguiu ver a face daquela áurea diferente, era uma
pantoriana, logo notou pela forma como estava vestida. Ela o fitava com a mesma
surpresa, pois devia esperar um parceiro do seu condado, mas sentia no cheiro
amadeirado vindo do controlador ao lado que ele só podia ser de Shillon.
Ficaram ajoelhados ombro a ombro. O Senhor do Império Husfillo, Ezus, ordenou
que fossem vistoriar a educação secundária nas escolas da Cidade da Luz. Os
dois esperaram o Imperador deixar o salão e em seguida levantaram, quando
finalmente puderam se olhar.
O velho do
cajado fez uma pausa para dizer: - Um simples olhar foi suficiente para impelir
tudo quanto justifica a minha presença aqui na frente de vocês – depois retomou
a história deslocando alguns centímetros o cajado de lugar no qual apoiava a
mão direita.
O coração de
ambos bateu descompassado no peito e visivelmente eles foram envolvidos por uma
sensação estranha, naqueles olhares havia desejo rompendo a barreira da
sangrenta rivalidade entre os condados, fomentando a necessidade de estarem
perto um do outro feito metal e ímã.
O condado de
Shillon detinha o poder da mente e disputava as águas do Rio Cósmum com o
condado de Pantorian que detinha o poder da magia – explicou o velho.
Ao deixarem o
salão caminhando lado a lado disseram as primeiras palavras:
- Como é o seu
nome? – indagou o jovem controlador segurando o peito, confuso com o que estava
acontecendo consigo, mantinha os olhos negros fixados na beleza da parceira
filha do povo inimigo do seu povo.
- Meu nome é
Sâmylla. – ela também não entendia o que estava acontecendo dentro do seu peito
– E o seu? – quis saber retribuindo o olhar tendo o rosto do jovem parceiro
refletido nos seus olhos verdes.
- É Yorhan –
respondeu - Nunca tive uma parceira antes – comentou tentando esticar a
conversa.
Os dois continuavam caminhando na direção dos cavalos.
- Essa é a minha
primeira missão e estou feliz por realizá-la ao lado de alguém com experiência.
– disse a pantoriana enquanto caminhavam em passadas idênticas sobre a grama
que cobria a área em volta do castelo.
Montaram nos
animais que haviam ficado pastando na margem do rio no lado norte da morada
imperial e partiram para a missão.
Enquanto
voavam montados em seus cavalos brancos de asas enormes não davam chance para o
silêncio. Os dois jamais haviam participado das inúmeras batalhas de poder
travadas entre seus povos e estavam estranhamente ligados por uma força nascida
no íntimo dos dois. Concluíram rápido a missão e ficaram com um longo tempo
disponível para fazerem o que quisessem. Yorhan aproveitou para convidar
Sâmylla a ir conhecer um lugar especial, onde costuma se refugiar quando estava
decepcionado com algum acontecimento. Cavalgaram até o alto de uma montanha
cheia de colunas de pedras. Sâmylla não entendia por que estavam ali ao invés
de estarem fazendo o relatório que teriam que entregar no final do dia. Yorhan
pegou na sua mão e a fez segui-lo ao topo de uma das colunas de pedra, em
seguida pediu a ela que olhasse para o horizonte, era possível se perder só de
olhar aquela imensidão interminável.
- Não é bonito
o encontro do azul do céu com o verde da floresta? – indagou à parceira?
- É lindo, mas
não era necessário tanto esforço para me mostrar esta maravilha, podíamos ter
visto do alto quando estivéssemos em nossos unicórnios alados.
- Sei disso!
Na verdade eu queria te apresentar a um velho amigo que vive aqui há muito
tempo.
Sâmylla ficou
mais confusa. Olhava para todos os lados e não conseguia ver nada além do verde
rasteiro cobrindo o chão. Logo quis saber onde estava o amigo. Yorhan sorriu,
pegou novamente na mão da parceira e a ajudou descer da coluna de pedra.
- Falo desse
amigo – disse ele apontando para a pedra gigante de onde haviam descido.
Sâmylla não
conseguiu segurar a gargalhada, não entendia como uma pedra poderia se tornar
amiga de alguém. E antes de fazer mais uma indagação disse ao parceiro que
tinha sido uma brincadeira muito engraçada, mas fora muito infantil. - Por que
você fez isso? - não pode evitar a pergunta.
Yorhan
insistiu – Não é brincadeira, costumo ficar horas conversando com ele... – a
ponta do nariz meio arredondado dele começou a ficar vermelha.
- Conversando?
– a gargalhada foi repetida – Pedras não falam!
- Diga olá
para essa incrédula, Drhoom. – Yorhan olhou confiante para a pedra.
Sâmylla
continuava sorrindo, ela devia estar imaginando em como o povo de Shillon podia
dominar o poder da mente se um de seus representantes parecia tão infantil.
Yorhan olhava
para o alto da pedra como quem desesperadamente esperava uma resposta, mas a
pedra sequer dava um sinal. Sem a resposta do amigo tentou explicar para a
parceira o que estava acontecendo, num esforço inútil. Sorridente Sâmylla o
convidou para voltar ao palácio. Cavalgavam sem pressa de chegar enquanto
atravessavam uma colina e depois uma floresta antes de alcançar o palácio
imperial.
Na manhã do
dia seguinte de sol radiante erguendo detrás das duas montanhas ao leste eles
voltaram a se encontrar na sala do Senhor do Império. Ela já o aguardava e
quando Yorhan entrou seus olhares se cruzaram e de um modo magnético
inexplicável se atraíam feito metal e ímã. Ele quis saber por que o Senhor Ezus
não estava na sala. Permanecendo com o olhar fixado em Yorhan Sâmylla explicou
que Ezus havia saído para se reunir com o exercito da Paz, mas que logo
retornaria. Com passos idênticos se aproximavam um do outro atravessando o
grande salão. Sem perceber Yorhan começou a dizer elogios para Sâmylla como se
estivesse num transe de hipnotismo, demonstrando um comportamento totalmente
inusitado que fugia aos hábitos de toda uma era, ele dizia o quanto ela era
linda e inteligente citando cada qualidade e comportamento que ela tinha. A
jovem pantoriana gostando muito do que ouvia indagou por que agia daquela
maneira absolutamente incomum. Já a dois passos fêmea perfeita aos seus olhos
Yorhan respondeu que estava louco alucinado, era a única explicação, muito
embora jamais conhecera os sintomas do estado de insanidade mental de cujo um
louco podia apresentar. Sâmylla jamais ouvira outro shillonio dizer aquelas
palavras estranhas.
- Louco, como
assim? – ela quis saber em meio a confusão na se perdia a sua lucidez de
missionária.
- É, louco
embevecido de uma força sentimental avassaladora que foge aos meus domínios. É
como se tudo tivesse parado e eu não vejo mais nada além de você. Não ouço nada
além do som melodioso saído da sua boca que penetra em meu ouvido e invade a
minha alma de servidor. E apesar de tê-la encontrado apenas há um dia eu sinto
na profundeza do meu íntimo, e muito mais no meu coração, como se eu já te
conhecesse há muito mais tempo. É tudo um sonho, eu sei, e quando eu acordar
estarei no meu descanso obviamente chorando por ter despertado da mais bela
viagem que me levara o irreal fruto do sono.
- Não! Mas não
é um sonho. – Sâmylla refutou – Nós estamos aqui e é real!
- Por que você
diz isto? Você sabe que é. Que é apenas um delírio meu. Logo não estarás mais
do meu lado.
- Não, não
pode ser. Porque tudo quanto tu estás sentindo eu também estou sentindo no meu interior.
É como se existisse apenas você no universo inteiro. Suas palavras são como a
brisa que ao tocar o meu corpo eu me sinto bem como se eu estivesse no paraíso
preparado por Akeus, segura, onde ninguém pudesse nos separar.
Akeus era o
deus daquela dimensão – nos explicou o velho Ghelf Rharum, em seguida
prosseguiu:
Yorhan sentia
o coração querendo saltar do peito, assim como Sâmylla, ambos não sabiam como
se comportar diante daquele surpreendente sentimento, embora a missão de suas
vidas fosse espalhá-lo por toda a dimensão estavam incapazes de compreendê-lo.
- Eu não
consigo mais ficar sem pensar em ti, Yorhan. Sinto vontade de tocar em você e
de te beijar, estou estranha, a ponto de querer violar todas as leis e regras
impostas ao nosso povo.
Suas
respirações tocavam suas faces quando já não havia um passo sequer os separando
e pelas mãos grudaram seus corpos. Sâmylla permanecia como uma inocente cheia
de dúvidas – Sinto como se um fogo ardesse sobre meu peito queimando tudo dentro
de mim – disse ela olhando no fundo dos olhos parceiro.
- Não sei
medir o tamanho de tudo isto que está aqui em mim a ponto de sair a qualquer
instante, é como se houvesse passado um furacão levando tudo que eu já vivi ou
já tive e não restasse nada além de você me transformando em um novo ser.
Seus lábios
quase se tocaram, mas passos no corredor quebraram o encanto do momento. Os
dois se afastaram temendo a chegada de Ezus. Porém impelidos pela vontade de
consumar seus desejos marcaram um encontro secreto na Alameda dos Sonhos, lugar
onde só os Senhores da dimensão dos Eufillus freqüentavam em encontros de
procriação.
Ezus entrou no
salão como se algo muito grave estivesse acontecendo e ordenou a sua serva
acompanhante a reunir o conselho, pois estava preocupado com o que o profeta
lhe dissera durante a reunião com o Exército da Paz. O grande acontecimento
havia chegado – informou antes de se sentar no trono.
- Mas ele não
sabe do que se trata? – comentou Elizah antes de cumprir as ordens.
- Sabe. Mas
prefere dar um tempo.
- E quando não
houver mais tempo? – a serva parecia aflita.
- Não, não sei
o que acontecerá. – Ezus demonstrava inquietude virando de um lado para outro
no trono com um semblante perturbado.
- Ah! Senhor,
estes dois jovens aguardam pela próxima missão. – a serva apontou para Yorhan e
Sâmylla de modo indiferente.
Ezus olhou
diretamente para Yorhan demonstrando grande afeto por ele ser o encarregado
mais competente no cumprimento das missões de provocação, por isto havia
ganhado o título de Primeiro Amor, dono dos sentimentos, detentor do poder da
mente. Como se falasse a um filho o grande Ezus revelou para Yorhan e sua
parceira o que deveriam fazer na próxima tarefa, eles deveriam unir uma centena
de casais e tinham apenas até o final do dia para realizarem a missão.
Aquele parecia
um dia reservado exclusivamente para o amor pelo clima primaveril envolvendo o
jovem casal. Apesar da cansativa tarefa eles realizavam a missão sem perder o
brilho dos olhos e o calor do coração. O dia para eles não teria mais fim,
sentiam como um pressentimento de algo bom que haveria de vir. Em cada vilarejo
que passavam davam instruções e lançavam o pó do afeto com mais dedicação,
pareciam amarrados por um feitiço dos mais poderosos de cujo laço não tinham
como se livrar.
Mas enquanto
Yorhan e Sâmilla viviam aquela inusitada atração o clima era tenso e de muita
discussão na sala do Conselho Geral, o falatório era desordenado o que obrigou
o orador levantar a voz e declarar silêncio absoluto para que fosse possível
acontecer o pronunciamento do Senhor Imperador Ezus. O Senhor do Império
Husfillo cruzou a sala até o Altar montado no canto norte, onde sentou na
cadeira Glorial vermelha com adornos dourados e disse: - O motivo que nos
obrigou a convocar essa reunião em caráter de urgência é muito grave, eu
desconheço os detalhes, entretanto o profeta Saladim irá nos esclarecer do que
se trata porque ele teve uma visão. Todos ficaram pasmos, pois só o fato de o profeta
ter uma visão já era motivo de alerta total, não sendo algo para o bem.
O velho Ghelf
Rharum contava a história como se tivesse presenciado cada momento daquela
reunião extraordinária pelo modo como falava que já estava nos convencendo.
A história
prosseguia sendo revelada pelas palavras daquele misterioso velho: O profeta
chamado Saladim ficou de pé do lado esquerdo do Altar e começou a explicar em
alto tom - Há algum tempo venho tendo visões horríveis sobre o amor e seu
futuro na nossa dimensão. Todas as noites as estrelas me revelam que em breve o
amor será extinto no universo e para nós isto significaria a nossa extinção, o
que marcaria a evolução do nosso planeta com o início da dominação das forças
obscuras num reinado que poderá nunca ter fim. Esta visão não me deixa
descansar os olhos durante a noite. Somente nós podemos evitar que isto
aconteça, por isso é nossa responsabilidade evitar esta catástrofe.
- Mas esta
extinção se deve a que? Como isto poderia acontecer? – indagou um dos
religionários.
Saladim
continuou explicando - Todos nós sabemos que somos a própria existência do amor
e por nós o amor existe no universo e em todas as dimensões. Porém se dois dos
Eufillus usar desse amor entre si, Ele os destruirá e a todos nós, sendo a
força desse poder impossível de ser absolvida por cada um de nós devido a sua
grandiosidade imensurável. Por este motivo não somos gerados num ato de contato
físico direto.
A dúvida ainda
pairava sobre os conselheiros, religiosos, generais e governantes do Império –
Deixe-me entender melhor esta sua revelação, profeta, respondendo-me, apenas um
casal seria suficiente para provocar tamanha destruição? – indagou o
conselheiro imperial I.
O profeta
coçou a barba e respondeu: - Sim Adoor, por ser um mundo onde o amor reina o
mínimo de amor existente entre os de nós seria avassalador. Nada poderia por
fim, nem mesmo o tempo. Seria um sentimento tão puro e poderoso e tão real como
nenhum outro, que poderia oprimir os demais ao ponto de exumá-los.
- Então isto
está perto de acontecer? – Ezus perguntou preocupado.
- Está. O
tempo se aproxima – Saladim alertou.
Todos
começaram a falar de uma vez só, até que uma voz em tom mais alto procurou
novamente o profeta - Como poderíamos evitar? – indagou outro religionário
fazendo o restante se calar por um instante.
- Talvez se
contássemos a todos os outros habitantes... – o comentário surgiu no meio de
tantos outros.
Saladim
advertiu imediatamente - Não podemos divulgar o que aqui está sendo discutido.
Seria precipitado e arriscado demais. A curiosidade tomaria conta de todos e o
desejo levaria a todos querem provar desse amor proibido.
O segundo
conselheiro se levantou e disse que a solução era esperar acontecer para então
convencer o casal a não prosseguir com o envolvimento. Outro conselheiro
levantou a hipótese de não haver um entendimento por parte dos envolvidos e o
Imperador Ezus foi taxativo, disse que se precisasse tomaria medidas extremas.
Todavia o que
eles discutiam na sala do Conselho já estava acontecendo e ainda não haviam
percebido. O jeito diferente de Yorhan e Sâmylla se olharem indicava o perigo.
TRÊS
Aquela
história era realmente fantástica com um teor poderoso capaz de sugar a nossa
noção de tempo e espaço. Mas de repente o velho começou a desaparecer e a voz
de tom grave quase assustadora dele já não podia ser mais ouvida, ele foi
sumindo vagarosamente bem ali diante de nós quatro até as folhas se alvoroçarem
indicando seu sumiço tão misterioso quanto o seu surgimento. Como num aperto de
botão de um controle remoto fomos libertados do transe sinistro e tudo a nossa
volta parecia normal, mas quando eu olhei para o lado direito vi que Lígia já
não estava unida ao grupo. Foi quando então nos levantamos e caminhamos de volta
para a universidade. As pedras também haviam desaparecido e o baú ficara
invisível. Mantínhamos o silêncio enquanto caminhávamos de volta a sala de
aula. A garota que conseguia fazer congelar as palavras na minha boca sempre
quando estávamos a sós nos esperava escorada no corrimão da escada que dava o
acesso ao prédio da universidade.
- Não sei como
eu vim parar aqui! – disse ela ao nos ver – o que aconteceu? – ela indagou
parecendo bastante confusa e talvez assustada.
Rael galgou os
degraus se fazendo ser seguido por nós três enquanto tentava compartilhar com
Lígia o mistério sinistro que todos nós havíamos vivenciado – De repente eu
estava olhando um velho baú cheio de tesouros, depois um sujeito esquisito
apareceu dizendo ser o dono de tudo aquilo e agora eu estou aqui tentando
entender por que tudo desapareceu tão rapidamente, como se eu tivesse acordado
no meio de um sonho – comentou.
Eu concordei
com ele, pois também estava sem entender o que havia acontecido.
Quando
entramos na sala de aula o professor estava juntando seu material de trabalha
para deixar a sala indicando o final daquele período, foi quando olhei no
relógio do meu celular e caí na real das horas que tínhamos nos ausentados e já
era o momento de retornar para casa.
Despedimos-nos
e cada um dos meus amigos seguiu para o estacionamento onde pegaria o
transporte, eu peguei meu capacete, tirei o cadeado do pneu que mantinha segura
a minha bicicleta ao suporte do estacionamento e comecei a pedalar tentando
esquecer tudo quanto havia ocorrido naquela manhã. Eu esperava que nunca mais
voltasse a passar aquilo tudo outra vez.
Porém a minha
esperança parecia minguar quando cheguei na universidade no dia seguinte,
depois de uma noite mal dormida por ser atormentado por sonhos esquisitos e
pelo barulho irritante causado pelo jovem com quem eu dividia o quarto. A força
aliciadora outra vez atraía minha atenção assim que eu me aproximei da escada.
Como de costume os meus amigos correram ao meu encontro e inexplicavelmente
decidimos ao mesmo tempo voltar ao local do encontro fabuloso, as nossas mentes
só podiam estar sendo controladas por uma mente superior e poderosa.
Ligia
caminhava na frente e quando ela pisou sobre a linha do santuário, que o velho
havia mencionado, o cenário místico ressurgiu num passe de mágica, mas já não
nos assustou, mesmo quando Ghelf Rharum saiu de detrás das duas estátuas de
pedra. – Eu os esperava – disse ele se apoiando no cajado para trocar passos em
nossa direção – ontem o puro de coração entre vocês saiu de repente e me
interrompeu, no entanto hoje eu continuarei a contar o que houve com aquele
belo jovem casal – afirmou apontando com os olhos a estátuas.
Sem deixar que
disséssemos uma palavra ele retomou a história e nós sentamos sobre as folhas
secas para ouvi-lo.
Em breve mais dessa história lendária. Este é o meu novo livro que estou escrevendo.
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